A Sexta-feira Santa termina assim: em silêncio. Um corpo envolto num lençol com um rosto já lívido. Esta miniatura acima, atribuída a Simon Bening (1525-1530) — não menos que o Cristo de Holbein, que fez o Príncipe Puskin gritar: “Que beleza salvará o mundo?” —, nos deixa com essa mesma pergunta angustiante. Sim, quem nos salvará, se Aquele que acreditávamos ser o Messias nos entregar à solidão de um mundo teimosamente rebelde ao bem e ao verdadeiro, inflado em suas certezas?
É assim que a Igreja parece hoje: pequena, como aqueles poucos que permaneceram no Santo Sepulcro. Nesta hora de dor, multidões esperam pela multiplicação dos pães, sem nem mesmo a proteção de uma sombra; sem a sombra protetora dos setenta e dois discípulos, dos doze apóstolos, e daqueles primos que um dia voltaram a orgulhar-se do parentesco com o Senhor. Nosso artista quis colocar Pedro, de cabeça baixa, deprimido pela traição que acabara de consumar. Ele não tem mais a auréola, perdida na luta demoníaca que assolou a colina do Gólgota.
Pensando bem, aos olhos dos discípulos tudo deve ter parecido um desfalecimento total. Ah se não tivesse sido a Mãe, dentro daquele silêncio! A Mãe e as outras Marias: Maria de Magdala, Maria de Cléofas, Salomé. Na hora do sepulcro, como no parto, são as mulheres que resistem.
Neste Sábado Santo, me parece que devo rezar por elas, pelas mulheres deste século, por aquelas que têm de vencer a batalha contra a destruição da sua dignidade, contra a mercantilização do seu corpo, contra uma cultura que faz do seu útero de vida um lugar de morte.
Se as mulheres não permanecerem firmes nesta hora, o que será desta humanidade cansada e desolada? É linda a miniatura de Simon Bening, que mostra Maria quando o seu véu azul começa a cair. O azul é o Mistério, e por isso pode, com certeza, significar a desolação da Mãe diante da divindade ultrajada de Cristo. Mas o azul é também a cor da noite, de um céu que se tornou escuro e não pode ver a Deus. De sua cabeça, brilha já a aurora da Páscoa, pois ela confia no Senhor. Ela se agarra a Aquele corpo como a uma tábua de salvação. O sepulcro está ali atrás, à espera, com suas mandíbulas abertas, enquanto no horizonte se destaca a cruz com a escada da deposição; tudo se refere à hora da dor, mas a Mãe beija o Filho como se tivesse acabado de sair de seu ventre, com a vida e a vivacidade de um recém-nascido.
Surpreendo o olhar de José de Arimateia, maravilhado com aquele gesto maternal. Ele também ajuda a segurar o corpo do Salvador. Uma leitura da quinta semana da Quaresma, de São Gregorio Nazianzeno, pede que nos identifiquemos com um dos personagens presentes em cena durante a paixão. Gosto como ele apresenta José de Arimatéia: aquele que pede a Pilatos o Corpo de Jesus; é alguém que ousa. É aquele que vai ao poderoso de plantão e não se deixa intimidar. Ele vai e pede o que a Igreja tem de mais precioso: o Corpo do Salvador.
Assim devemos ser nós: pessoas dispostas a perder tudo, mas não a Eucaristia. Devemos gastar os degraus da porta dos poderosos de plantão e exigirmos o Corpo de Jesus, a possibilidade de celebrar, de adorar, de transportar este corpo pelas ruas e praças da cidade. Sim, rezo pelas mulheres, minhas contemporâneas; mas também rezo pelos homens, por aqueles que, como José de Arimateia, ousam; e por aqueles que, como Nicodemos, não ousam. Este Corpo os encontra reunidos e irmãos.
Este Corpo tem um apelo sem precedentes. Nós devemos nos apegar a ele. A Eucaristia é um silêncio perene, cheio de vida, na história da humanidade. Um santo sábado sem fim que atravessa as tempestades da história. Lembro-me do exemplo de Sátiro, irmão do grande Santo Ambrósio. Ainda catecúmeno, foi salvo de um terrível naufrágio segurando o Santissimo contra o peito; ele, que não sabia nadar, para salvar-se salvou primeiro o Santíssimo Sacramento.
Eis-nos aqui: que nas tempestades da história, no Sábado Santo da nossa fé, possamos nos agarrar à Eucaristia, certos de sermos salvos.
http://www.lanuovabq.it/it/disposti-a-perdere-tutto-ma-non-leucarestia
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